Construída no início dos anos 1970, durante o regime militar, rodovia
representou o projeto de integração nacional e hoje é uma estrada fantasma,
condenando milhares de amazônidas ao esquecimento, o isolamento no meio da maior
floresta tropical do mundo
Portal de entrada no município de Humaitá (AM) |
Uma fileira de 22 veículos
off-road entrou na cidade de Humaitá, no Amazonas, chamando a atenção dos
moradores no final da tarde de domingo, 24/11. Com adesivos coloridos,
carregados com equipamentos de trilha, pneus para lama e tripulados por pessoas
uniformizadas com uma camisa branca, as caminhonetes e jipes saídos de Porto
Velho levavam esperança para a população. “Agora tem que sair a reabertura da
rodovia!”, gritavam algumas pessoas, acenando para a diligência que ficou
conhecida pelo slogan “BR-319 – Chega de Atoleiro”.
A cidade de cerca de 80 mil
habitantes foi a primeira parada da diligência promovida pela Comissão de
Agricultura e Reforma Agrária (CRA) do Senado Federal, por solicitação do
senador Acir Gurgacz (PDT-RO). Com mais de 60 pessoas, dentre políticos,
jornalistas, empresários, servidores e jipeiros, a diligência (ou expedição,
como também foi chamada) provocou uma onda de alegria entre os moradores de
Humaitá. O motivo era claro: a cidade, que fica no Amazonas, tem uma boa
ligação terrestre para Porto Velho, mas não para a capital do próprio Estado,
Manaus. A diligência, que teve o objetivo de levar informações para autoridades
federais sobre a real situação da via, foi vista como uma possibilidade dos
moradores verem a rodovia reaberta.
Praça Central de Humaitá e Catedral Nossa Senhora da Imaculada Conceição |
Vista panorâmica do rio Madeira, em Humaitá |
Mas não apenas moradores das
cidades cortadas pela rodovia reconhecem a importância da ação. O vice-prefeito
de Ji-Paraná, Marcito Pinto (PDT-RO), que participou da diligência, destacou a
importância estratégica da BR-319 para a economia regional. “Manaus é o maior
mercado consumidor da região Norte, são nossos vizinhos e não conseguimos fazer
negócios com este mercado. Precisamos reconstruir esta estrada para dinamizar a
economia regional, o que será bom para o comércio, para a agricultura e para a
indústria de toda a Amazônia”, frisou Marcito Pinto. Para Marcito, os
pecuaristas e frigoríficos de Ji-Paraná e da região Central do Estado seriam
beneficiados com a reabertura desta rodovia. “Além disso, o comércio entre os
dois Estados criaria uma nova dinâmica na economia regional tornando
estimulando a agroindústria que cresce a cada dia em Rondônia”, frisou Marcito.
Vice-prefeito de Ji-Paraná, Marcito Pinto |
PROMISSORA - Na vila de
Realidade, distrito de Humaitá, o madeireiro Ronieque Zanys fez questão de
procurar os integrantes da diligência para mostrar a dura realidade de quem ali
vive. “O lugar aqui é bom, tem tudo para a gente crescer, mas falta estrada!”,
desabafou. De acordo com o madeireiro, que é oriundo de Rolim de Moura, é
possível trabalhar na produção rural e no extrativismo apenas três meses por
ano. “O resto do tempo é ficar olhando a chuva cair do céu, não dá para fazer
nada, porque ficamos isolados aqui. Ninguém vai plantar para depois ver o
produto apodrecer”, explicou.
Zanys explicou que trabalha com
compra e venda de madeira com manejo ambiental, e que a região é promissora,
mas ele provavelmente vai ter que abandonar Realidade. “Se não fizerem estrada
já no ano que vem não vou ter mais como fica acumulando prejuízos. Eu também
sou brasileiro, também quero ter uma casa boa, um bom carro. Não sou bicho para
viver isolado no meio do mato”, acrescentou.A diligência apurou que depoimentos
como esse não são raros ao longo dos poucos trechos habitados às margens da
BR-319.Realidade hoje tem cerca de 5 mil habitantes, sendo que 3 mil no perímetro
urbano e o restante no setor rural, dentro da floresta. Depois da vila é
possível ver poucos sítios até cerca de 300 quilômetros de Porto Velho, e quase
nenhuma habitação até chegar perto de Igapó-Açu, perto de Manaus.
Madeireiro Ronieque Zanys, do distrito de Realidade |
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